O fundador e primeiro diretor do jornal Público morreu na madrugada desta terça-feira. Vicente Jorge Silva, de 74 anos, era jornalista, quis ser cineasta e ainda passou pela política.
Vicente Jorge Silva relançou e dirigiu o Comércio do Funchal (cidade onde nasceu em 1945), foi diretor-adjunto do Expresso e, mais tarde, cofundador e diretor do Público. Morreu durante a madrugada desta terça-feira, em Lisboa.
A notícia foi avançada pelo jornal Público.
Natural do Funchal, onde nasceu a 8 de novembro de 1945, Vicente Jorge Silva era um apaixonado por cinema, mas acabou por fazer carreira no jornalismo, tendo ainda sido deputado, uma experiência da qual não gostou.
Com apenas 15 anos, idade em que admitiu à RTP Madeira ser “um bocadinho rebelde”, foi obrigado a abandonar o liceu, por problemas com a PIDE, devido ao que, já na altura, escrevia. Começou a ter problemas com a Polícia Política no Estado Novo, com cerca de 14 anos.
“Chamaram-me à PIDE por causa de escrever nos jornais coisas que não devia. Eu ousar escrever nos jornais sem ter idade para isso já era um sinal de rebeldia que os incomodava”, relembrou numa entrevista Vicente Jorge Silva.
Viveu em França, onde trabalhou numa fábrica de cola e depois em Inglaterra, onde se tentou inscrevere numa escola de cinema, mas o consulado português não lhe prolongou o visto, acabando por ficar a lavar pratos num hotel. Regressou à Madeira em 1966, para dar um novo fôlego ao jornal regional Comércio do Funchal.
Vicente Jorge Silva marcou uma geração no jornalismo em Portugal, sendo dele a polémica expressão “geração rasca”, num editorial que assinou aquando das manifestações estudantis contra a então ministra da Educação do Governo de Aníbal Cavaco Silva, Manuela Ferreira Leite.
Começou por escrever artigos sobre filmes na página “Foco”, do Jornal da Madeira, tendo assumido mais tarde a direção do Comércio do Funchal. Mais tarde, enquanto chefe de redação e diretor adjunto do Expresso, foi responsável pelo lançamento da revista daquele semanário. Mas terá sido o lançamento do Público “o seu maior desafio profissional”, de acordo com a publicação do diário.
A ideia de criar um “diário de referência, moderno, europeu” foi de Vicente Jorge Silva, mas juntaram-se vários jornalistas do Expresso – como Jorge Wemans, Augusto M. Seabra, Henrique Cayatte, José Manuel Fernandes, José Vítor Malheiros, Nuno Pacheco, Joaquim Fidalgo e José Queirós.
Em 1996, sai do Público, com 51 anos, e passa a dirigir a revista Invista, que durou pouco tempo.
“De facto, desde o Público nunca mais tive uma coisa que me enchesse as medidas”, admitiu ao Observador, há exatamente um ano.
O jornalista foi colunista de vários jornais, entre os quais o Diário de Notícias e o Público, onde regressou nos últimos anos, ocupando a coluna que tinha sido de Vasco Pulido Valente.
Enquanto jornalista foi ainda distinguido com dois prémios, entre os quais o Prémio Cupertino Miranda, considerado o de maior relevância à época no jornalismo português.
Além do jornalismo, Vicente Jorge Silva abraçou projetos no cinema e na política, enquanto deputado pelo Partido Socialista, eleito pelo círculo eleitoral de Lisboa.
Vicente Jorge Silva foi militante e deputado do PS, entre 2002 e 2004. Não gostou da experiência como deputado porque para um jornalista “não é possível mudar de pele e alma”, afirmou, numa entrevista há quatros anos, ressalvando que este comentário não se traduzia numa crítica à essência da vida política.
“O cinema era um grande sonho”, mas era mais difícil “ser cineasta do que jornalista, afirmava na entrevista “Uma vida, uma história” à RTP Madeira, em 18 de março de 2016, acrescentando que quando tinha más notas os seus pais não o deixavam ir ao cinema.
Enquanto cineasta destacam-se os filmes “O Limite e as Horas” (1961), “O Discurso do Poder” (1976), “Vicente Fotógrafo” (1978), “Bicicleta – Ou o Tempo Que a Terra Esqueceu” (1979) e “A Ilha de Colombo (1997)”. Porto Santo (1997), seu último trabalho no cinema, foi exibido no Festival Internacional de Genebra.
FONTE: RTP